A Última Jogada,  Histórias

01-04 – A Última Jogada | O Duelo | SÉRIE

Vendo que eu hesitava, Dante roubou a bola da minha mão e se preparou para começar o duelo. Um jogador tão inexperiente quanto eu, mal sabia como seria as regras nesse tipo de jogo, mas me armei na defensiva, e me preparava para um ataque que sabia que não teria como parar. Dante fez sua primeira jogada passando por mim como se fosse uma pilastra, não tive reação, não houve tempo.

— Pelo menos tenta da próxima vez — ele disse com a voz carregada de raiva.

Peguei a bola para reiniciar o jogo e Dante roubou a bola da minha mão novamente.

— Quem faz a cesta continua com a posse de bola. Nem isso você sabe!

Com outro ataque rápido, Dante enterrou me derrubando no chão, a queda foi dura, mas preferi não demonstrar que doeu.

— Mesmo com falta não consegue me parar.

Me levantei e me preparei para o novo ataque, outra vez não consegui ser ao menos um desafio para Dante.

— Muito fraco!

Dante atacou outra vez, mas de uma forma agressiva, em suas passadas largas em direção a cesta me derrubou com os joelhos, e completou a jogada com outra enterrada.

— Outra falta sua, seu ruim. Você não sabe jogar?

— Dante, para! — repreendeu Daniela. — Deixe ele em paz!

— O time está cheio de jogadores lixos igual você. Por isso não vão a lugar nenhum. Você não tem talento, você nunca vai aprender a jogar basquete direito. Desiste logo, e não perca tempo.

Dante deixou a bola no chão e se dirigiu para a porta do ginásio quando Daniela acertou uma bola de basquete em sua cabeça o fazendo virar. Desistiu de reagir ao perceber que havia sido sua irmã.

— Se você soubesse se comportar igual gente não teria sido expulso dos outros times! — gritou ela com a voz embargada. — Eles te aceitaram e você deveria agradecer por ainda terem paciência com você. Ninguém mais te quer!

Dante não ficou para continuar escutando sua irmã. Saiu batendo a porta do ginásio. O clima estava pesado.

— Me desculpe pelo meu irmão. É um idiota e está de mau-humor hoje.

— Ele tem razão — comecei a dizer. — Eu não sou talentoso e está tarde demais para eu aprender a jogar bem. Nunca vou ser um jogador profissional. Mas não é para isso que estou aqui. Eu quero jogar porque gostei de jogar. E ficarei melhor a cada dia que me dedicar, com o tempo vou poder ajudar de alguma forma o time.

Daniela enxugou as lágrimas que ameaçavam cair, pegou a bola e fez um arremesso.

— Você está arremessando de lado, tenta manter seu corpo reto em direção a cesta. E não se esqueça dos joelhos. Arremesse com o corpo todo, não apenas com os braços.

— Obrigado. Acho que preciso treinar bastante ainda.

— Você está muito bem para quem está começando. Tenho certeza que vai ser muito importante para o time, de alguma forma eu sinto isso.

— Espero que sim — respondi, e para minha surpresa havia acertado uma cesta.

— Sabe, nem todos precisam jogar basquete esperando chegar a NBA. Cada um tem seu objetivo. O que importa é saber aondequer chegar.

— E aondevocê quer chegar?

— Na WNBA — ela sorriu de forma ingênua, e por um momento eu vi algo além da força e firmeza que passava como técnica do time. — Sei que parece contradição. Mas um dia eu chego lá.

— Não parece contradição. Do jeito que vi você jogar, acho uma possibilidade real. Não faço ideia do que é necessário fazer para entrar na WNBA, mas acredito que você consegue.

— Obrigada. Você é muito gentil. E é muito difícil entrar. Mas tenho que ir. Não posso deixar o traste do meu irmão sozinho, ele costuma criar problemas. Desculpa novamente por ele. E não acredite em nada do que ele disse, você pode sim aprender a jogar bem, só se esforce o suficiente que você consegue — ela sorriu e eu percebi que ela estava sendo sincera, e confesso que acreditei e me animei a continuar treinando.

Daniela saiu e eu continuei meu treinamento, atento a posição do meu corpo e toda a mecânica de arremesso. E ali continuei tentando colocar em prática os conselhos, pegando coragem para enfrentar meu pai. De certa forma, era por causa dele que entrei no time, mas era por minha causa que decidi continuar.

***

— Onde você estava ontem à noite? — quis saber meu pai, tomando café da manhã com pressa.

— Saí com uns amigos — respondi.

— Que amigos você fez em um dia de aula? Não mente para mim. Onde você estava?

— No treino de basquete! Pronto! É isso que você quer saber?

— Eu falei para você não ir! Nem isso você é capaz de fazer? — o advogado perdia a compostura acertando um tapa na mesa em que tomava café da manhã. — Você não veio para cá para perder tempo com essas idiotices que não vão te levar a nada. Estude primeiro, depois você faz o que quiser da vida.

— Fazer o que quiser, tipo acordar cedo para trabalhar e chegar tarde? Não ter tempo pra nada, não ter tempo pra família, nem ter amigos? Não fazer nada além de trabalhar? É isso que é fazer o que quiser?

— Eu tive que me matar de trabalhar para sustentar você e sua mãe e é assim que você agradece?

— Você não precisava trabalhar tanto. Você fazia pra fugir de nós!

Farto da discussão, saí da cozinha e me tranquei no quarto, ouvi música para tentar não pensar no quanto não gostava das atitudes do meu pai. Não lembrava de nenhum momento que estive feliz junto dele, foi ausente em todas as partes da minha vida e agora devia obedecer suas ordens para ser igual a ele. Não poderia aceitar, não queria ter o mesmo destino que meu pai.

Na escola, preferi ficar distante de todos. No intervalo sentei afastado no ponto mais discreto do pátio amplo que o colégio Salvador Rio-Bravo possuía. Entre as árvores de um pequeno jardim abandonado pelos alunos, e pensei no que queria esquecer.

— Ah, você aqui? — perguntava Sid ao se aproximar.

duelo

— Esse colégio é grande demais pra mim.

— E agitado nos intervalos. Aprendi com o tempo que é melhor me distanciar da multidão desocupada, adoram perturbar. E aqui é um ótimo lugar. Quase ninguém vem pra cá.

— As pessoas ficam te perturbando por quê?

— Sabe… eu sou um prato cheio para quem quer zoar alguém. Não é à toa que me chamam de Sid.

— Pensei que esse fosse seu nome.

— Não, não. Me chamo Samuel. Mas alguém achou que eu pareço com um personagem da animação Era do Gelo. Antigamente eu até me importava, mas agora já me acostumei, nem ligo mais.

Sid era uma figura considerada exótica para alguns. Seu rosto sempre projetado para baixo, tímido, suas inseguranças eram evidentes. Falava baixo, parecia ter medo que alguém escutasse. Mas era amistoso, um ser que transmitia a sensação que seria incapaz de fazer mal a alguém.

— Não precisa se preocupar. Pode me chamar de Sid mesmo. Todos me chamam assim.

— Aí está você. Te procurei pelo colégio inteiro — Disse Daniela aparecendo de repente dando um susto em nós dois. — Vocês estão fazendo o que aqui?

— Aqui não tem chatos metidos a valentões — respondeu Sid.

— Ah tá, esqueci que vocês são nerds — ela riu. — Mas enfim, finalmente te encontrei, Gabriel. Queria pedir desculpa de novo por ontem. Meu irmão não é sempre assim, estava mais irritado que o normal, e ele costuma fazer imbecilidades quando está assim.

— Tudo bem. Nem ligo.

— O que aconteceu? — quis saber Sid.

— Meu irmão foi um verdadeiro idiota com ele ontem depois do treino. Tem horas que não aguento mais o comportamento dele. Não sei como somos irmãos gêmeos. Queria largar ele de mão, mas tenho medo do que ele pode fazer se eu não estiver por perto.

A jovem era alta comparada à média feminina, estava diferente de como costuma ir para os treinos. Usava maquiagem que realçava sua beleza simples, batom rosa, seus cabelos lisos e negros estavam soltos e jogados pelo ombro. O uniforme definia sua silhueta e revelava sua boa forma.

— Espero que não saia do time por causa dele.

— Não vou sair, pode ficar tranquila.

— Obrigada! Te vejo no treino amanhã — disse ela dando um beijo rápido na minha bochecha, e saiu em direção a suas amigas.

Sid arregalou os olhos surpreso.

— E-ela…te beijou…

— Foi só um beijo no rosto.

— Ela nunca beijou o rosto de ninguém do time.

— Não foi nada demais.

— Como não? A marca do batom ainda está aí. Você é uma espécie de escolhido. Você trará o equilíbrio a força.

Eu ri com a referência e principalmente ao perceber que Sid falava com a expressão séria. Parecia acreditar no que dizia. Continuamos conversando sobre coisas que gostávamos em comum. Ele tinha gostos parecidos com os meus para séries e filmes. Discutíamos sobre qual seria o herói mais poderoso, e como ele poderia ser derrotado, e sempercebermos já estava no final do intervalo. Seguimos para nossas salas, e eu havia recuperado o bom-humor.

Em casa, fiz o possível para evitar meu pai, que não foi difícil. Escutei quando ele chegou, já era tarde, não teria tempo hábil para qualquer conflito.

No dia seguinte decidi chegar mais cedo ao treino para praticar meus arremessos.

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Fiquei sozinho no ginásio treinando o que lembrava. Minhas tentativas continuavam péssimas, mas estava mais confortável por não ter ninguém olhando. Porém, isso mudou quando percebi que a porta de entrada estava abrindo como se alguém não quisesse fazer barulho. Notei que era Daniela que estava à espreita com uma bola de basquete na mão.

— Por que você chegou tão cedo? — perguntou ela.

— Estou precisando treinar, e você?

— Eu costumo chegar cedo, meu irmão que me atrapalha às vezes. Posso treinar com você?

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Guilherme Orbe

Desenhista, escritor e sonhador. Comecei a criar histórias na infância e nunca mais parei. No começo me dediquei as histórias em quadrinhos, onde desenvolvi minhas habilidades de desenho. Hoje me dedico a literatura, e transformo minhas histórias em livros. Criar histórias é meu passatempo favorito.

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